segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Real

Enquanto eu cantarolava alguma música que eu gostava e escrevia uma história, me chegou um sujeito, desses curiosos que vão logo bisbilhotando o que você está fazendo. No começo era um rosto normal, depois uma sobrancelha ergueu-se numa inconfundível cara de "Hã?", um olhar de esguelha e por fim, um maxilar se abrindo, o que anunciava uma idiotice a caminho, através da passagem das mentiras - a boca:

- Cara, que viagem!
- É, uma viagem bem legal.
- Certo, agora volta pra realidade.
- Eu vivo em tantas realidades que você teria que ser bem mais específico...

Sobrancelha erguida, olhar de esguelha. Saiu de fininho, provavelmente ponderando sobre o quanto eu era louco. Eu, com uma inconfundível careta de piedade pensando o quanto ele era louco por acreditar em apenas uma realidade.

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Olhar

Sentado ali, cantando The Blower's Daughter na beira da praia numa tarde de inverno. O clima estava propenso a uma música assim. Estava acompanhado, uma raríssima oportunidade que ele tinha. Ele queria olhar para sua companhia, mas preferiu encarar o mar. Por mais vasto e misterioso que fosse o mar, ele não te encararia de volta, ou talvez encarasse, mas você nunca saberia onde exatamente ficam os olhos do mar. E sabem o que dizem: Os olhos são a janela para alma.
Os dele eram portas. Livros abertos, em escrita simples. O que se tinha pra saber sobre ele, estavam ali.
Arriscou relancear para aqueles outros olhos atentos à sua esquerda, emoldurados por um lindo sorriso logo abaixo e ávidos por ler o seu livro aberto.
Não entendia como conseguiam compreender que ozônio era raro, ouro era precioso, mas não conseguiam entender a complexa raridade da beleza daquele olhar. Era único, era inocente, desprovido de intenções e atentados mal intencionados. Tentou manter o olhar por alguns segundos. Não conseguia.
Olhar por tempo demais para o sol pode te cegar. Não queria cegar, ainda tinha que encarar bastante o mar, mas agora com um discreto queimar nas rubras bochechas.

sábado, 17 de novembro de 2012

Amor popular Brasileiro


Eu quis te conhecer, mas tenho que aceitar, caberá ao nosso amor o eterno ou o "não dá". Pode ser cruel a eternidade, mas eu sigo em frente por sentir vontade, mas temos muito tempo...temos todo o tempo do mundo. E ninguém dirá que é tarde demais, que é tão diferente assim. Do nosso amor a gente é quem sabe. Eu só quero saber em qual rua a minha vida vai encostar na tua, e nesse dia, se o mundo acabar, não vou ligar pra aquilo que eu não fiz. Faz muito pouco tempo que aprendi a aceitar: Quem é dono da verdade não é dono de ninguém. Já não dá mais pra viver um sentimento sem sentido, eu preciso descobrir a emoção de estar contigo... ver o dia amanhecer e ver a vida acontecer como um dia de domingo. Faz de conta que ainda é cedo.

Como dois estranhos, cada um na sua estrada, nos deparamos, numa esquina, num lugar comum. Estranho seria se eu não me apaixonasse por você, mas eu não estou interessado em nenhuma teoria, em nenhuma fantasia nem no algo mais. Me interessa mais amar e mudar as coisas
Onde a pálpebra aconchega, onde já fechou o bar, na esquina da alameda, na virada da vereda, eu estou a lhe esperar. O que é bonito é o que persegue o infinito.

domingo, 14 de outubro de 2012

João e Maria

Se eu pudesse, eu não teria te deixado me soltar naquele momento. Se eu pudesse, eu sequer teria deixado o momento nos soltar. Se eu pudesse, eu teria dito eu teria feito eu teria eu queria eu ia
Pensando bem, eu até acho aquele momento meio cômico. Eu embasbacado, você sempre fugindo, uma enguia que deslizava fácil entre meus descuidos. Amores de verdade parecem querer sempre fugir da gente, né? Pera, será que é amor de verdade?
Vou parar de falar de você. É, tô entregue num daqueles malditos momentos que você não quer pensar em algo, daí começa a contar até palitinho de caixa de fósforo pra não pensar em... bom, nem lembro mais no que eu tava pensando. Sério. Tá, não tão sério.
Eu só queria achar em você tudo aquilo eu perdi em mim, sabe? Um pouquinho da minha infância, um pouquinho de fé, um pouquinho de sorvete de flocos com biscoito e misturas de guaraná com fanta no mesmo copo pra ver que sabor vai ter. É mais ou menos isso que eu queria. Mais ou menos.
Tá, esquece, vou falar da TV. Eu tentei, mas a programação atual é tão miserável que acho que é proposital pra gente desligar a maldita televisão e focar no que a gente não quer pensar. 
Eu só queria não pensar tanto no futuro do pretérito. Se os pássaros não comerem todas as migalhas, um dia eu acho meu caminho de volta pro presente.


sábado, 22 de setembro de 2012

Contos de fadas

Era uma vez um pequeno rei que morava num castelo de areia e névoa. O castelo ficava num reino de gigantes de pedra com garras e sorrisos de borracha.
Era uma vez um pequeno rei, num castelo de luz e sombras, reinando numa terra de mentiras e pedregulhos. O pequeno rei, em seu grande castelo, dando ordens a ossos velhos, criados da escuridão da fortaleza, vendo nascer em si uma grande firmeza. De dia em dia o reizinho brincava com os gigantes, olhava-os com admiração e respeito, pois naquela terra todos os gigantes lhe tinham apreço; pena que em terra de gigante força de alma não é força de peso, e por ser pequeno, o reizinho era tido apenas como um menininho, pássaro sem ninho, que não poderia jamais sozinho voar ao alto do céu.
Pobre reizinho, prisioneiro inocente de suas próprias douradas correntes numa gaiola prateada incrustada de diamantes. 
Pobre reizinho, reinando sozinho, entre pedras e passarinhos. 
Pobres gigantes, quão deselegantes eram em achar que era seu tamanho maior que o mar.
Apesar de sozinho, descobriu o reizinho, as maravilhas de seu reino. Dos pássaros que fugiam pelo ar, das cores que invadiam seu corpo, que expandiam seu olhar até onde pudesse alcançar. 
Que maravilha de reino!, pensava o reizinho; que reizinho mesquinho, pensavam os gigantes vizinhos, só vê o que quer.
Era uma vez um rei crescido, soprando sentido a poeira da qual era feita seu castelo. Seus gigantes criaram garras de navalha, bocas cheias de lava, e olhos da mais refinada escuridão. 
Ó, pobre reizinho, cresceu sozinho entre monstros gigantes de luz e escuridão. Que se foi seu castelo, de areia desfeito, de névoa dissipada, de luz mareada e escuridão clareada. Toda a poeira desfeita de maneira a não restar nem menção; todos os criados, de ossos velhos antigos, eram na verdade vidro que racharam ao olhar. 
- Um brinde ao reizinho, que sabe sozinho, lutar em terra de gigante! 
O reizinho, chorava sozinho em terra áspera de castelo de ar. Reizinho, reizinho, te criastes sozinho, não vedes então que o mundo não vai amansar? Tantos gigantes tentaram mesmo há instantes outra vez te derrubar. Te deram mentiras para saborear, mentiram teus amores, mentiram tua união, conservastes entretudo algo em teu coração? Conserva, reizinho, tua força e carinho, teu espírito de leão que nunca conhecerá quem o dome.
Era um vez um reizinho, vendo sozinho a escuridão de todo o reino. O reino contudo, assim como o castelo, era de poeira e se desfez com o olhar. Era uma vez um rezinho, criado sozinho, em reino de ninguém.
- Vai, reizinho, crias um reino de verdade, larga a saudade, e vai que tardas em cuidar.


sexta-feira, 17 de agosto de 2012

,mas

foi dito que eu estaria bem se eu me casasse e tivesse um bom emprego. Por que eu sinto essa dor?

- Seu burguês de merda! - Sente um jato de saliva atirada com força contra a sua cara. Ele estava sentindo tanta dor que não deu muita importância. O marginal disparara contra seu peito sem anunciar assalto, sem falar nada. Apenas se aproximou, o examinou bem de cima a baixo e disparou.
 Ele não podia fazer isso, eu passei tanto tempo defendendo o direito das minorias, e ele atirou em mim...

- Eu quero ver seu sangue escorrer por essa calçada de merda, como o meu escorre todo dia de merda, seu burguês de merda!  - Deu as costas e começou a andar calmamente.

O alarde causado pelo disparo acionou os policiais que perseguiram o bandido algumas ruas, pois ele começara a correr ao ver os seguranças. Deram cinco tiros nele, tendo sido dois na cabeça. 

A esposa chegou pouco tempo depois chorando, com um filho no braço, também chorando, ajoelhou-se e segurou a mão do marido baleado. Trocaram últimas palavras de amor. Foi uma cena triste de ser vista.

Três dias depois o noticiário da TV anunciou a morte de um importante defensor dos Direitos Humanos, e que o seu assassino, um homem frio e sem coração, havia sido morto no local. Outro jornal impresso, de menor porte, anunciou a covardia e a violência com a qual os policiais assassinaram um jovem da periferia, ferindo os Direitos Humanos e o quanto as classes menos favorecidas eram impunemente vítimas de injustiças.

A esposa observou tudo pela televisão, o marido de 21 anos fora morto a tiros por policiais. Ela se ajoelhou no chão com um filho no braço e amaldiçoou a alma do marido por deixá-la só e sem condições de se sustentar. Foi uma cena triste de ser vista.


Foi dito que eu estaria bem se eu me casasse e tivesse um bom emprego, que eu viveria feliz, que era o melhor a se ter nessa vida, e ainda assim eu estou morrendo. Malditos sejam, mentiram pra mim, só que eu sempre soube...no fundo, que é cada um por si, sempre. Se mais algum desgraçado repetisse pra mim que tudo ficaria bem eu lhes diria um grande e sonoro

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Caixa - Capítulo 10 (FINAL)

É isso aí, depois de tanto tempo, esse conto chegou ao fim. Aos meus leitores, sintam-se livres para comentar o que acharam. Abraço, e até a próxima. E sim, vai ter próxima! =D
Caixa - Capítulo 10 (FINAL)

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

E finalmente...o começo de novo.

Eu passei tanto tempo sem escrever assim, tipo, normal, sem ser um texto específico que deu saudades agora e resolvi matá-la, afinal duas coisas a gente TEM que matar: Um filho da puta e a Saudade. Ah, não sei se alguém se pergunta isso - ou melhor, se alguém realmente lê isso -, mas o motivo de eu não ter postado o último capítulo de Caixa é por causa de uma entidade chamada Greve, acompanhada por outra chamada "Professor-desgraçado" que me enviou uma magia negra chamada "Trabalho-nas-férias", e eu tô meio que sem tempo de escrever. Bom, na verdade não é bem sem tempo, não estou com o devido tempo para escrever um final DECENTE.
A este ponto alguém já chiou sobre eu ter chamado a greve de Férias. A você que chiou, cheire meu flato, porque pra mim É FÉRIAS SIM! Se os professores tão cagando livremente pelo mundo à espera de um milagre governamental (e ainda têm tempo de enviar trabalhos para arruinar as minhas férias), porque eu não posso chamar esta merda da forma como eu quiser? "Ah, é uma luta social, mimimi". A sociedade tá pouco se fudendo pra essa greve, com exceção dos afetados, sabe por quê? Porque a sociedade é feita de pessoas, e as pessoas estarão sempre pensando nelas mesmas. "Não é assim!", é assim SIM! Tem uma frase foderosa no filme "Hotel Ruanda" em que o protagonista fala que tem esperanças de solução do problema principal do filme porque está sendo transmitido para a TV mundial, ao passo que outro personagem responde: "Eles veem essa cena pela TV na sua sala de jantar, suspiram chocados dizendo "Meu Deus, que barbárie!", e continuam a comer tranquilos e seguem com suas vidas". É isso.
Bom, podem me condenar agora. "Se você fosse professor, você saberia do que a greve se trata!". É, é, talvez, mas se vocês pararem com a hipocrisia conseguiriam ver em vocês mesmo uma parte gritando "Ele está certo! Eu estou sendo enrabado por esses 'movimentos sociais'".
Ainda sobre a sociedade, sabe essa coisa de "Ser diferente é legal"? Não é. É só o politicamente hipócrita correto dizendo isso. Se você pensar diferente, vai ser discriminado. Se você demonstrar isso, não quero nem pensar... Sim, eu mesmo devo ter sido mentalmente incendiado por essas singelas palavras. E quer saber? Eu me sinto diferente, muito diferente. Eu me sinto estranho, eu penso estranho, eu ajo estranho, eu gosto de coisas estranhas, e simplesmente sei que "Ser diferente NÃO é legal!". "Ah, tá vendo, se você se ligasse nos movimentos sociais saberia do Direito das Minorias". FODA-SE ESSA MERDA! Esse Direito é só uma mentira cabeluda inventada pela classe dominante para que a bancada evangélica tivesse motivo pra existir e ser contra.
Por hoje é só, quem não estiver puto da vida e quiser ler os textos que escrevi, sejam bem-vindos, gente linda e culta. Abraço.


segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Poliglota

Se eu soubesse o que se passa nos espaços das suas sinapses...
 Eu queria compreender o vácuo nas nossas conversas, a falha na minha atitude. Je peux parler le français, Watashi wa nihonho hanase masu, mas da língua que tu falas não partilho fonema. Será que somos assim tão diferentes, você com seu sorriso e eu um esgar contente?
Se você pudesse me escutar, se você ouvisse meu coração gritar, entenderia, pois se não, a língua de todo coração. É um tum tum pra todo mundo, mas pra você é tumtumtum.
Perdoe a pieguice, é meu sintome de velhice, de humano calejado, que aguentou muito calado. 
Por favor, se você compreender meu palavrório, me deixa entender sua língua, divida comigo as palavras nas suas entrelinhas, diz que não é só uma coisa minha, pega meu inglês e transforma num beijo francês, vem inventar palavrão em cima do meu colchão em uma língua que só a gente partilha.


Sobremesa

Põe sobre a mesa um amor de sobremesa
Esquece os doces, a vida, a receita
Deixa os problemas e as dúvidas
Fora da massa e da fôrma da gentileza
Põe um olhar de doçura, uma conversa imatura
Diz que não sabe o canto, deixa rolar o encanto
Vamos a um canto, não precisamos de pranto
Nem de pratos, só de abraços

De canto de boca, de língua solta
De beijo no pescoço, cheio de alvoroço
Tem espaço pra mais um pouco
Põe então teu corpo
E deixa rolar

Amor de sobremesa é tudo o que eu quero na minha mesa.


quinta-feira, 12 de julho de 2012

Caixa - Penúltimo Capítulo

Devido à demora no lançamento desse capítulo e (me sinto até orgulhoso em dizer isso) pela pressão de alguns leitores, estou postando esse capítulo quase sem revisão. Eventuais erros, por favor, me desculpem. Depois do lançamento do último capítulo (programado pra semana que vem), planejo também disponibilizar uma versão completa do conto, pra quem tem preguiça de buscar um por um. Obrigado a todos vocês leitores, espero que gostem desse novo capítulo.
Caixa - Capítulo 9

quinta-feira, 28 de junho de 2012

Sombras

Paga-se pedágio para manter-se na vida. Sinto como se nossas progenitores botassem pra fora uma essência verdadeira, e ela se mantém verdadeira até os sete anos. Daí em diante, pagamos pedágios diários de pedacinhos de nós mesmos pra poder continuar andando na estrada da vida. E a cada dia que passa, perdemos um pouco da essência que foi parida inicialmente. É por isso que temos que morrer? Por que acabou nossos meios de pagar pedágio? Ficou pra trás só uma casca vazia, sem essência?
Faz sentido isso. Entendo assim também como chegar aos 25 anos, se encarar na frente do espelho, e ser encarado de volta por uma pessoa que você desconhece totalmente. Ela é tão diferente de quem você estava acostumado a ser, que você sequer ousa chamar aquela figura de reflexo.
E assim você continua pagando o maldito pedágio, já se sentindo uma mera sombra de quem você já foi, um reflexo distorcido de alguém outrora feliz e grande.

sábado, 16 de junho de 2012

Caixa - Capítulo 8

Sim, o mistério chegou ao fim. Pelo menos a maior parte dele. Finalmente nosso protagonista ficou face a face com quem poderia sanar todas as suas dúvidas. E agora? O que vai acontecer com ele? A caixa foi aberta. Inimigos do herdeiro, cuidado.


8 - K e Chá

quarta-feira, 6 de junho de 2012

Caixa - Capítulo 7

Pra compensar meu atraso de dois dias, nada mais justo que duas páginas a mais que o de costume! Espero que aproveitem que o capítulo 8 sai logo logo.


terça-feira, 29 de maio de 2012

Bom dia

Coimbra, 20 de julho (Dia do amigo)
Bom dia, Jonas

Escrevo-te esta singela epístola para contar que encontrei em meu baú algo que talvez você nem se lembre. Eram três garrafinhas, simples, como aquelas de geleia, que comíamos quando eramos crianças, lembra? Me emocionei ao ver o conteúdo. Sabe, querido amigo, lá dentro encontrei engarrafada uma de nossas aventuras, mais especificamente aquela na qual escalamos o muro de seu vizinho e fingimos que éramos detetives em busca de pistas. Na segunda, engarrafei nosso primeiro beijo, inocente, infantil, apenas por acharmos que havíamos crescido, quando na verdade, amigo, estávamos ainda na aurora da mocidade. Na terceira, não pude conter lágrimas e as verti incessantemente. Pois, saiba, saudoso amigo, que engarrafei também o nosso momento de despedida, para nunca me permitir esquecer que um dia você me prometeu voltar.

Carinhosamente,
Amelie

P.S.: Anexei foto das garrafinhas. Espero que elas mexam contigo tanto quanto mexeram comigo.


segunda-feira, 28 de maio de 2012

sexta-feira, 25 de maio de 2012

Mundinho, Mundão

-510 072 000 km² de superfície terrestre, 6 803 000 000 habitantes, 396 países...Em algum lugar existe amor, né? O mundo assim tão vasto...
-Pra existir amor não se calcula vastidão de espaço, se calcula vastidão de sentimentos, criança. O que realmente conta, no fim, é o espaço que se tem no coração.
-Mesmo assim, há esperanças?


O velho tragou mais uma vez o cachimbo e soprou para longe a fumaça espessa, cobrindo o ar ao redor. O menino o olhava curioso, com um atlas geográfico na mão. Ele queria uma resposta.  E o velho sabia, sem querer dizer, que não havia resposta alguma.

quinta-feira, 24 de maio de 2012

- E daí?, eu perguntei.

- E daí que ninguém mais notou que fizemos de veneno, remédio. Tomamos uma dose a cada dia para, ironicamente, nos sentirmos melhores. Eu só espero que um dia ... Ah, a quem estou enganando, eu já não espero mais nada.


Magia

Havia uma pequena elevação no terreno à minha frente. Estávamos nós duas apenas, eu ainda na margem da floresta, ela em campo aberto, de cima daquela pequena colina, olhando para o longe. Seus cabelos longos balançavam ao vento, e mesmo que eu não entendesse aquela atitude de promiscuidade, eu não conseguia deixar de me sentir maravilhada. Fui até perto dela, buscando compreender por ela o que acontecia. O vento lá em cima realmente era forte, mas não fazia frio algum.
- Ficou maluca? O que você está tentando provar, vindo até aqui, nua?
Ela limitou-se a olhar para mim com uma expressão que parecia pena, ou compaixão. 
- Anda, responde! Foi por isso que me deixou só na barraca? Para vir aqui dar algum espetáculo?
- Meu amor, não tem mais ninguém aqui por perto!
- Quem garante?
- A natureza. Não sente minha querida, o vento nos chamando?
- O vento apenas sopra, amor, ele não fala.
- Nós também apenas sopramos, mas conseguimos entender o sopro de cada um perfeitamente.
- É porque produzimos SONS! - Estava cansada daquela discussão maluca, que particularmente achava que não levaria a nada. Coloquei à mão sobre a testa e o pescoço dela, para certificar-me de que não possuía febre e delirava. 
- Então você não consegue ouvir? Não consegue sentir a terra também chamando?
- O que é isso, ainda está bêbada? 
- Ouça, até as árvores estão falando. Elas riem de você! - E começou a rir abertamente. Apesar de preocupada pela saúde mental dela, não pude deixar de sorrir ao vê-la feliz.
- Anda, veste alguma coisa antes que se resfrie. Chega de brincar de ouvir árvores e ventos e seja lá o que mais for. Só falta me dizer que também tem visto fadas?
- Na verdade, eu encontrei uma colônia inteirinha delas! Tinha até alguns duendes, também!
Olhei para ela incrédula. Havia uma naturalidade na forma como ela pronunciava cada palavra que me deixava pasma. Ela estaria tendo algum colapso? Como se lesse meus pensamentos, ela me abraçou e me beijou. E me olhou profundamente, novamente com aquela expressão de ... ah, piedade?
- Você sabe que eu te amo, né? Independente de qualquer coisa? Eu só queria que às vezes você parasse de espantar a magia.
-Magia? É disso que essa cena se trata? Você aqui, nua, no meio de um campo aberto para me falar de magia?
- Eu estou aqui nua porque não há outro motivo para não estar. A natureza me deu estas roupas com as quais me vê, e não entendo porque deveria usar alguma outra quando me apresento à ela.
- Porque você é minha namorada e essa tal de natureza vai ter problemas se não parar de querer te ver nua.
Pelo menos agora ela ria. Levei a de volta aonde estávamos acampadas e a convenci a se vestir. Depois, falei que ia encher os cantis no riacho ali perto. Antes de poder sair, ela jogou em mim um feitiço através de palavras, um feitiço que já foi repetido milhares de vezes por milhares de pessoas. Era algo mais ou menos assim:
- Quando você me viu ali em cima, não sentiu nada de diferente?
- Além de ciúmes e preocupação com você pegar um resfriado?
- Você sabe do que estou falando.
Eu realmente sabia. Eu senti meu corpo todo se arrepiar, ela ali em cima, majestosa como uma rainha, não, mais, ela realmente me lembrava ... uma Deusa.
- Olha, deixa eu ir logo.
- Sabe, você acredita em magia e não sabe. 
- O que quer dizer?
- Quando você olha nos meus olhos, quando você me abraça, quando você me toca, o que sente?
Aí estava. O feitiço fora pronunciado. Ela pegou justamente onde eu me recusava olhar: No âmago das minhas emoções, no núcleo de tudo que sou. Eu não havia mais escolha que não me render à verdade:
- Magia. - Eu falei, sorrindo de leve. Pronunciar aquilo fez eu me sentir tão mais leve, como se eu finalmente estivesse sendo verdadeira comigo novamente. O peso de alguma mentira antiga fora magicamente removido por ela. "Magicamente", repeti mentalmente, "Já começo até a pensar como ela".
E quando cheguei ao riacho e vi meu reflexo, notei-me tão majestosa quanto minha amante. "Também sou Deusa!", pensei. E me senti tão feliz naquele momento ...
 Tomei o caminho de volta, mais alegre. E no andar, comecei a ouvir uma música diferente, vindo de algo que poderia ser o vento?, me interroguei. Depois risadas vindo das árvores, e apertei o passo. Na barraca, ela me esperava vestida.
- Vem comigo, querida. Não precisa da roupa dos homens, vem só com a que a natureza nos deu. Eu também ouvi a terra chamando.
E fomos juntas, vestidas de natureza, acompanhadas de perto por duendes e fadas, e por risos e canções.

sexta-feira, 11 de maio de 2012

4

O vento ululava, profecias assustadoras
Promessas de um futuro irrisório
Quem nunca prometeu dobrar o tempo
Foi quem nunca soube o que era amar.

Mar

Eu vi o mar
Ele ia até tão longe...
Vasto, profundo
Tão azul, Tão salgado
Cheio de mistério que só mulher!
E vinha pra cá, molhava a Sinhá
E ia pra lá, arrastava a Sinhá.
Ô, seu mar, vê se me trás
Do lado de lá
Um amor mansinho
Bem cheio de carinho
Onde eu possa me afogar

Caixa - Capítulo 4

Gente, eu sei que me pediram pra eu postar outras coisas além do conto "Caixa", mas eu postarei assim que possível. É que é meio que um projeto meu no qual eu realmente estou focado, mas logo retorno às postagens -curtas- habituais. Obrigado a todos que estão gostando da história, e agora disponibilizo o quarto capítulo. Obrigado, pessoal.


4 - Caixa

segunda-feira, 7 de maio de 2012

Caixa - Capítulo 3

Bom, se alguém tá gostando ou não, se tem alguma crítica ou sugestão, por favor, COMENTEM! Ah, disponibilizei uma versão online, pra quem teve dificuldade de baixar pelo 4Shared. :D

Capítulo 3 - Caixa

sábado, 5 de maio de 2012

E


E sabiam amar a si próprios.Precisavam apenas de comida e água para sobreviver, e um amor para aguentar o peso que a vida trouxesse. E já se mendigou comida.
E não sabem amar a si próprios. Não precisam de amor, desprezam-no. Não precisam de comida, desperdiçam-na. Não precisam de água, poluem-na. E agora se mendiga atenção.
E ninguém parou e disse "Não quero sua falsa atenção!"
E então perdeu-se o amor próprio. E então perdeu-se o sorriso sincero. E então perdeu-se. E nada ganhou em troca, senão a frase "É a vida.".
E ninguém parou pra dizer "Não há mais vida.".

[Danilo C. Lopes]

terça-feira, 1 de maio de 2012

Lençóis

Lembro-me pouco dos últimos dias de vida de meu avô, apesar de que eu já era uma moça quando tudo aconteceu. Ainda mais curioso, eu fui uma das netas que cuidou dele até a hora de deixar este mundo. Coisa curiosa, como eu que deveria me lembrar tão bem, lembro apenas vagamente: do hospital, de como estava fraco, das enfermeiras tão dedicadas que vinham sempre ao seu quarto. Meu avô, com 65 anos, sofria de um grave problema cardíaco, uma condição rara, em que o músculo cardíaco se afrouxava e perdia a força necessária para bombear o sangue por todo o corpo. A primeira vez que notamos algo foi na compra dos preparativos para o natal. Era uma tradição de família de longa data reunir, toda a família para uma opulenta ceia na fazenda de meu avô, de nome Serafim. Dois dias antes da comemoração, vovô, Tio Cosme e eu fomos comprar o que faltava para a festa. Distante uns 30 km da cidade, saímos da fazenda para as compras de manhã, com intenção de voltar ao cair da tarde. Perto do pico do sol chegávamos ao Supermercado Frei Damião, o maior da cidade. Ao terminar as compras e levá-las à caminhonete de Seu Serafim, o próprio resolveu levar mais do que realmente podia, graças a uma brincadeira do meu tio de desafiá-lo. Num minuto, lá ia ele todo orgulhoso carregando compras e mais compras e no outro, ele tombava. Desmaiou de maneira tão abruta que achávamos que tinha escorregado. Logo depois, o barulho das sirenes de ambulância, o cheiro de éter do hospital e o cruel diagnóstico.
 A festa de Natal foi abandonada, mas se tornou festa de ano novo e de alta de Seu Serafim. Comemorávamos duplamente, e ele se emburrava por ter de seguir uma “dieta inútil”.
Um ano e oito meses após, o meu celular toca. “Aline, precisamos de você aqui. Seu avô passou mal novamente. Você pode acompanhá-lo?”. Vô Serafim praticamente havia me criado. Claro que eu o acompanharia. Peguei o primeiro avião que pude e assim que aterrissei na cidade vizinha à dos meus avós, Tia Vera me esperava com seu carro. Rapidamente nos dirigíamos ao hospital. Muita gente, muita conversa, risadas e meu avô, que apesar do ataque da noite passada estava bem. Aparência de bem. Cuidei dele com a dedicação que pude, às custas de noites de sono e de um período da faculdade. Mas Seu Serafim piorou numa noite chuvosa. UTI. Aquele odor de produtos de limpeza e de hospital com café expresso de uma máquina próxima. Logo depois eu entrei. Mas aí já nada me recordo. Nem do rosto do meu avô nem de nada. Lembro-me da notícia que ouvi dias depois. “Seu avô veio a óbito ne...”. Não entendia mais nada. Não queria entender mais nada. Quando se une “óbito” com alguém que sempre esteve em sua vida numa única frase, as palavras logo começam a perder sentido. E depois todo o resto, tudo se esvai num borrão aquoso. E choveu. Choveu muito, tanto lá fora, quanto dentro de mim. Choveu tanto que começou a escorrer pelos meus olhos.
Assim que consegui me recuperar, me dei conta que outras pessoas já haviam providenciado tudo o que cabia quando alguém morria. Tanto papel pra assinar e nenhum que garanta que aquele que se ama vai voltar, nos abraçar e dizer que tudo não passou de um pesadelo. Nunca conheci meu pai. Minha mãe fugiu de casa e me deixou com meus avós. Então meu pai sempre foi Seu Serafim, minha mãe sempre foi Dona Augusta, que mesmo agora estava ao meu lado. E meu pai, e avô, não estava mais comigo, já estava encantando outras pessoas em lugares que o8 s vivos não ousavam invadir. O velório teve café, teve choro, e todo o mundo estava de uma estranha cor cinza. Uma cor cinza, um ritmo cinzento, um clima chuvoso. Tudo era lúgubre. 
Hoje em dia, já formada, lembro-me apenas do momento da notícia. “Seu avô veio a óbito ne...”. Nesta manhã, provavelmente. Eu segurava os lençóis que ele pedira que buscassem de sua fazenda, para que ele se sentisse em casa. Lembro daqueles lençóis que pareciam uma bexiga que perde todo o ar, murchos. Enrolados em minhas mãos, pareciam adagas a cutucar-me o coração avisando que ele não voltaria. Os lençóis também morreram.  Lembro-me apenas dos lençóis, e de meu avó, de branco, me olhando atrás da porta da UTI, sorrindo como quem diz “Eu te amo, minha filha. Estou bem, está tudo bem.”

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Caixa - Capítulos 1 e 2

Se você tiver algum apreço por leituras aleatórias, leia esse conto feito por mim numa madrugada como qualquer outra. Você não vai se arrepender - ou vai, mas só vai descobrir se ler. É minimamente interessante, mas talvez surpreenda. Comentários são muito mais que bem vindos.

[SEGUNDA EDIÇÃO] Recebi reclamações de pessoas dizendo que era chato baixar parte a parte do conto. Decidi, portanto, postar as duas primeiras partes - as que foram publicadas - em um único arquivo. Boa leitura. Espero que gostem.

Caixa - Danilo Campos Lopes



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sábado, 7 de abril de 2012

Meu segredo

Meu segredo é um coração sentimental, mas duro. De tão sentimental, guardo em um local difícil de achar, e ando assim, com ele escondido, mas protegido, pra quando eu te encontrar.
Eu tenho mais um segredo, um pensamento, mas proibido, que só faz me alegrar. Eu tenho um pensamento, perdido, escondido, quem sabe se um dia poderei mostrar.
Eu tenho mais um segredo, um último segredo, meu coração é tatuado, meu pensamento é domado, você está em todo lugar. Se te guardo secretamente nos meus mais profundos segredos, quem dirá que meu real segredo é tanto assim te admirar?

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Cotidiano do travesseiro

Pareço feliz, mas já fiquei na cama pra dormir mais, mesmo sem sono, por achar que não valeria à pena acordar. É meio dramático, mas juro que foi uma coisa involuntária. Acordar, e me pegar pensando "Cara, o que tem de importante no mundo lá fora? Fica, vai ter sonho.". 


Receita pra criar uma polêmica

Ingredientes:

-Uma verdade incoveniente
-Um dogma (pode ser substituído por um tabu)
-Três doses de sarcasmo (No máximo quatro, senão perde o gosto real)
-Uma imagem que caracterize a polêmica (substitui o fermento)
-Uma público diversificado pra mexer.
-Sal na ferida à gosto.

Modo de preparo:

Misture tudo num texto ricamente escrito. A coisa flui naturalmente, pois a audiência própria cria a polêmica. Basicamente você só tem que colocar a verdade na frente deles com os outros ingredientes, sem fazer mais nada. Todo o resto flui naturalmente. Cuidado pra não exagerar na dose de sal. Outra coisa importante é saber separar uma verdade inconveniente de uma mentira convicente. É como separar joio de trigo, pirita de ouro bruto.


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O motivo de escrever isso agora é simples: As pessoas falam tanto em mentiras, falsidades, mas jamais se perguntam o quanto suportariam da verdade. Às vezes, certas mentiras, não são feitas com o intuito de magoar, mas de proteger. Outro motivo é advertir para aquelas coisas que por mais que pareçam avançadas, nos atrasam. Não tome tudo como verdade, saiba questionar. A polêmica surge exatamente da nossa incapacidade de nos flexionarmos ao questionamento. É um exercício diário, mas assim como o exercício da razão, é indispensável e indissociável da verdadeira evolução.

Dentro da Caixinha. E fora. E dentro de novo.

Estilo alternativo. Eis que me ponho a pensar sobre o assunto. Criou-se o estilo alternativo, ou indie, para determinar uma forma de se vestir, ou um gosto musical, ou um monte de outras coisas que fugiriam do padrão. Não me entenda mal, não venho criticar, só venho refletir sobre. Por exemplo, cabelos pouco cuidados (não necessariamente sujos), alargadores, piercings, bonés com aba reta, calça skinny deveriam fazer parte do chamado visual alternativo. Deveriam. Quantas pessoas que usam esses acessórios você já viu por aí? Eu vejo uma pá todo santo dia. Tá, então cadê a "alternatividade" aí?

 Ah, não tô dizendo "PAREM DE USAR ISSO JÁ!", mas cá entre nós, o visual tá perdendo a essência, não? Que tal você criar seu próprio look? O estilo alternativo de verdade tem um caráter de causar estranheza à primeira impressão. É normal, é o que o torna realmente indie. De tanto se repetir a coisa, algumas pessoas que como eu já questionam o termo "alternativo" e caracterizam os usuários como "adolescentes em fase de crescimento com complexo de rebeldia no vestuário" - não ponho nome de quem disse isso porque a própria pessoa assim pediu.

 Enfim, gente, pensar fora da caixinha exige um esforço próprio, ok? Não significa apenas ir de encontro ao que seus pais pensam, ou o que a geração anterior pensa/pensou. É uma questão de saber pensar também fora do pensamento da sua PRÓPRIA GERAÇÃO. É complicado, é difícil, e acredite em mim: Dificilmente alguém vai ficar do seu lado ou concordar com você.

Jovens, sejam alternativos, mas verdadeiramente, ok?

Carta de amor

"Bom dia, amor. Hoje eu sonhei com você de novo. Dessa vez você dizia que nossa briga tinha sido besteira e que tava tudo bem. Depois me abraçava e me fazia sentir segura como só você sabe fazer. Ah, tem mais, sabe a minha avó? Ela tá melhor, te mandou um beijão. Tá me doendo tanto essa falta que você me faz. Tô louca pra voltar a te ver. Vou sair correndo e pular nos seus braços de uma vez! Queria que você soubesse o quanto significa pra mim. Eu sinto como se em você eu pudesse confiar. Ah, eu também tava aqui lembrando de quando a gente começou a conversar, sabe, e você tava super mal por causa da sua ex. Eu morria de inveja dela, mas ficava dizendo "Calma, vai melhorar. Fica bem". Nossa, o jeito como você falava dela! Hunf. Depois eu comecei a rir lembrando disso. Eu queria tanto que naquela época você me dissesse que gostava de mim. E daquela vez que você disse que me achava bonita? Nossa, eu fiquei morrendo de vergonha e de felicidade ao mesmo tempo! Queria dizer "Eu te acho lindo!". Fico imaginando se você alguma vez falaria pra mim que me achava atraente de verdade. Eu sempre ficava tão louca pra falar algo assim, ficava imaginando se você pensava em mim dessa forma. Eu lembro que quando peguei seu número de celular fiquei louca de vontade de ligar e mandar mensagem na hora, mas me controlei. Ah, e quando eu mandei mensagem e a gente passou a noite toda conversando? NOSSA! Eu ainda sorrio quando lembro. Ah, antes que a carta fique longa demais eu vou terminar. Depois mando mais notícias, meu anjo. Beijo, espero que esteja bem. Saudades"


-Eu ia te mandar essa carta naquela viagem que fiz pra ver minha avó, lembra?
-Lembro sim! Quase morro de saudades de você. Por que só me entregou agora se você escreveu só naquela época?
-Na verdade eu escrevi quando a gente tava se conhecendo. Quando aquelas coisas da carta estavam acontecendo. Eu imaginei que se eu escrevesse uma carta fingindo que já namorava com você, talvez...acontecesse.
-Que engraçado. Eu tinha feito o mesmo.Quer ver?
-Depois, agora eu só quero...

E o mundo pareceu fazer silêncio pra contemplar aquele momento. E aconteceu um beijo, não um beijo qualquer, um beijo épico, quase de filme, como só uma grande paixão é capaz de produzir.

sexta-feira, 23 de março de 2012

Leis da Vida

Lei Fundamental ou Lei Evangélico-Irritativa: Quanto menor a razão, maior o volume da voz. 

A lei explanada: Cultos evangélicos, Parlamentares Corruptos, Viciados em Bar.


Segunda lei ou Lei da desobediência númerica ou Lei Campos-Lopes: Os números seguem o rumo contrário ao que você deseja.

 A lei explanada: Os números da balança aumentam, o da conta bancária diminuem, as dívidas aumentam, as horas de sono diminuem.

domingo, 18 de março de 2012

Ser efêmero

No começo não ter leitores me incomodava muito. Me tirava a vontade de escrever. Até que notei que eu tenho um dom, a graça de brincar com as palavras como outros brincam com as tintas, com as máquinas. Eu me divirto escrevendo, eu sou feliz escrevendo. Eu achei que escrever só valeria a pena se houvesse quem lesse e apreciasse de imediato o que foi ali posto. Se isso fosse verdade um quadro só valeria a pena ser criado se houvesse admiradores? Então Van Gogh não passaria de um comerciante qualquer não-conhecido hoje em dia. Bom, Lima Barreto sofreu uma inquisição à la mode na sua época por implantar o ácido cruel da verdade em seus textos e nem por isso deixou de ser bom escritor ou um crítico político notável de sua época. Escrevo agora pra notar que eu não me importo se alguém aprecia o que escrevo. Escrevo para dizer às palavras que as amo, pois ser apreciado por pessoas é cansativo, é desgastante, e o mais importante: Não dura. O que quer que você faça só você saberá valorizar verdadeiramente, os outros podem até admirar-se, mas é uma admiração maculada com a inveja. Palavras, como tintas, como idéias, como sons, têm poder sobre esses efêmeros seres ditos humanos. Elas mudam, moldam, destroem. É com amargor que escrevo agora, mas um amargor que me empurra a buscar o doce. Cresce-te também, monta-te para o alto, sem necessitar construir-te com outros ao lado, para te segurar como se fosses uma eterna torre torta condenada a cair, caso sozinha. Saiba ser, e mais ainda, saiba moldar-se e mudar-se, empurrando passo a passo para a evolução. Não importam se te criticam a estrutura, contato que tenhas forte o alicerce. Sois efêmero, humano, mas não precisa sempre fluir para o lado negativo das coisas.

domingo, 4 de março de 2012

Sacuda-o


 
Remorsos se acumulam como velhos amigos
Aqui para reviver seus momentos mais sombrios
Não vejo uma saída, não vejo uma saída
E todos os monstros saem para brincar

E cada demônio quer seu pedaço de carne
Mas gosto de guardar algumas coisas pra mim
Pois gosto de deixar minhas questões importantes afogadas.
É sempre mais escuro antes do amanhecer

E eu fui tola e cega
Nunca consigo deixar o passado pra trás
Não vejo uma saída, não vejo uma saída
Estou sempre carregando esse peso nas costas

E o nosso amor gerou tamanho ruído de sofrimento
Essa noite eu enterrarei esse peso na terra
Pois gosto de deixar minhas questões importantes afogadas
É sempre mais escuro antes do amanhecer

Liberte-se, liberte-se
Liberte-se, liberte-se, oh whoa
Liberte-se, liberte-se
Liberte-se, liberte-se, oh whoa

E é difícil dançar com um demônio nas costas
Então, sacuda-o, oh whoa

E eu cansei desse meu coração sem graça
Então, esta noite vou arrancá-lo e recomeçar
Pois gosto de deixar minhas questões importantes afogadas
É sempre mais escuro antes do amanhecer

Liberte-se, liberte-se
Liberte-se, liberte-se, oh whoa
Liberte-se, liberte-se
Liberte-se, liberte-se, oh whoa

E é difícil dançar com um demônio nas costas
Então, sacuda-o, oh whoa

E é difícil dançar com um demônio nas costas
E com metade de uma chance
Eu tomaria alguma coisa de volta?
É uma luta final, mas me deixou tão vazia
É sempre mais escuro antes do amanhecer

Oh whoa, oh whoa

E estou condenada se eu fizer
E condenada se não fizer
Então, estou aqui para brindar no escuro
Do final da minha estrada
E estou pronta para sofrer
E pronta para ter esperança
É um tiro no escuro mirando direto na minha garganta
Pois buscando pelo paraíso, encontrei o demônio em mim
Buscando pelo paraíso, encontrei o demônio em mim
Bem, que se dane
Vou deixar acontecer comigo

Liberte-se, liberte-se
Liberte-se, liberte-se, oh whoa
Liberte-se, liberte-se
Liberte-se, liberte-se, oh whoa

E é difícil dançar com um demônio nas costas
Então, sacuda-o, oh whoa

Liberte-se, liberte-se
Liberte-se, liberte-se, oh whoa
Liberte-se, liberte-se
Liberte-se, liberte-se, oh whoa

E é difícil dançar com um demônio nas costas
Então, sacuda-o, oh whoa

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Previsibilidade

Desculpem, pessoas, eu conheço-vos mais do que deveria. Conhecer o ser humano é como olhar de frente pra um portal de imensa tristeza. Acho que desde muito cedo fui exposto a verdades demasiado ácidas e corroi minha inocência irreversivelmente. E eu jurava ter encontrado alguém que usa branco num velório, que nada contra a maré de coisas tão iguais que vos tornaste, humanidade. Mas ledo engano, como suspeitei a príncipio, era apenas uma ilusão. "Vês, ninguém assistiu ao formidável enterro de tua última quimera." Ninguém. Porém, decerto, não é a última. E julgo que serei capaz de romper-me de minha própria barreira quando encontrar o destaque de alma. Sinto muito por ser assim tão ... preconceituoso, mas aos que olharam a mesma face da vida que eu, sabe quando de verdade se carrega nessas tempestuosas letras. Sinto muito, a mim mesmo, por ter enganado a nós.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Foto e Grafia

Quando o mundo parece estar de cabeça pra baixo
 E você se sente um caco, triste, sozinho, cansado
Como se o mundo estivesse te envelhecendo antes da hora
E você quer se segurar em coisas que não parecem reais
Por fim, acaba perdendo a cabeça
E você só quer pegar um trem pra bem longe e esquecer de tudo
Não esqueça que pra tudo tem uma solução
E ela pode até ser bem simples
 É só saber olhar do jeito certo.
.

(Todas as fotos pode ser encontradas em weheartit.com)

Era uma vez uma verdade...

Nem amigdalite me fez chorar tanto quanto minhas desilusões amorosas. Merecia ter um chá "Some-paixão" à venda nas melhores lojas.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Risos

Vou rir das babaquices da vida, para que as babaquices não riam de mim. Sou tão monótono, e agora até minha monotonia me diverte. Quero viver num rio caudaloso e imparável, não num lago. Quero ser uma cachoeira, não uma pedra. Eu rio dos meus desencontros, para que não riam de mim. Eu dou gargalhadas de quem me acha estúpido, pois os acho ainda mais inverossímeis. Apupo sem piedade esses mascarados em clone que vejo pela frente. Sou assim, tão mais eu. Me fantasio de mim mesmo todos os dias, e todos os dias tenho algo novo a usar. E pra quem sabe que todo mundo finge ser todo mundo menos quem realmente são todos os dias, eu também sei. Eu preparo um flan de diversão pra comer na frente de quem morre de fome de uma verdadeira felicidade. Gosto das coisas assim, doces. Compensa todo o sal e amargor de um dia de rotina, de um vai-e-vem de disparates de pessoas inconsistentes e absortas em coisas tão rasas. E se for dia de branco, eu uso luto. Ou um amarelo-ouro. Ou os dois. Eu gosto das coisas assim, tão sem nexo, sem fingimentos anexos, sem mentiras obrigatórias; mentiras essas que vêm até com carimbo, e hoje reconheço-os na face de todos que as usam, todavia, já tão gastas. E não é que sinto raiva de quem usa máscaras para falar comigo, só acho que eles perdem a chance de, como eu, ganhar um beijo na bochecha de quem me acha especial. Sou assim, sem tirar nem por.

-20

Tenho uma meta para o ano que vem. Nesta mesma data quero ter 20 quilos a menos no corpo, 20 toneladas a menos na consciência, 20 anos a menos na mente. Daqui a um ano terei 20 anos,e quero me sentir um bebê. Quero ter 20 espinhos a menos no coração; não arranco-os todos de vez para não me esquecer da amargura da vida. Quero ser mais eu, isso significa menos vinte. Perdendo 20 coisas que não quero, posso ter 20 coisas que posso gostar. É uma questão universal, não haver espaços vazios. Não há vazio no universo. Lavoisier em "Nada se cria, nada se perde. Tudo se transforma".

Essa é minha meta. Menos 20.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Divagações sobre amor

Aquelas nossas conversas que sempre me faziam rir. Você sabe exatamente como me deixar perdido. E enquanto falamos sobre o filme do momento, eu vejo filmes com momentos nossos. Eu acho que estou perdidamente apaixonado por você. Acho que de tão perdido, as palavras se perdem em meus sentimentos e não sei expressar muito bem. Mas acho que você sabe. Bom, penso que sim. Gosto dessa sua companhia descontraída, quando conversamos como quem tem uma eternidade pela frente. Eu gosto de acreditar que essa química entre a gente não se acaba. É tão bom ver o vento bagunçando seu cabelo, seu sorriso tão singelo, tão verdadeiro pra mim. Eu valorizo esse timbre vocal seu, presto mais atenção nele até mesmo do que no que você fala e vez ou outra me vejo dizendo "Desculpa, não entendi. Repete, por favor?". Se você soubesse o que causa em mim sua presença. E por último dou um beijo na sua bochecha só pra ver você corando. E o vermelho lhe cai tão bem...

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Deveres do Direito

Não um dos textos chatos cheios de requintes. É simples e direto, então senta bem aí e se preparada pra um jorro enxuto de idéias.

Um profissional da área do Direito conhece a fundo o funcionamento dos processos legais. Mas nem todos. Sabe o porquê de nem todos saberem? Bem, tem uma faculdade de Direito em cada bosta de esquina, e com 20 reais no bolso e nada na cabeça você entra facilmente. Que profissional sai? Bom, um profissional alguns milhares de reais mais pobre, mas com um diploma de Direito. Provavelmente essa facilidade de participar dessa área tão brilhante tornou as pessoas cegas para uma coisa simples: Por que estudar Direito?

"Ah, eu posso ganhar milhares com um único caso!"

Certo sua besta antropofágica, é verdade, mas a razão pela qual o Direito foi inventada é bem outra. Não me diga que você imaginava que o curso tinha sido inventado pra que pessoas pudessem ascender socialmente? Ou pior, nem pensou sobre isso? Faça um favor, em caso positivo, venda seus livros em um SEBO e vá brincar de amarelinha, ok?

Bom, imagine um mundo sem leis? Ou um mundo com leis baseadas na vontade de um déspota egóico? Pra evitar que se instalasse um caos egocêntrico no mundo das leis, pessoas passaram a analisar a melhor forma de criar um código (de leis). E vários foram feitos. Mas toda vez que um novo surge, há discrepância entre os atingidos por esse código. Por isso, pessoas começaram a se dedicar a estudar esses códigos para...

( ) Ganhar mais dinheiro
(x) Dar às pessoas as chances de não serem esmagadas por um sistema preconceituoso e ignorante aos problemas alheios.

E o que isso tem a ver com o Direito hoje?

Bem, você conhece alguém que disse ter sido injustiçado? Você já se sentiu assim? Então, é pra isso que há o Direito. O curso não é uma fonte inesgotável de grana, é a consolidação da luta de muitos sofredores, é a solidificação de um rio de sangue de inocentes. Foi a cartada final dada pelas vítimas do passado, eles deram suas vidas para que no futuro contássemos com uma arma que nos protegeria do mal que corrompe todos que ascendem ao poder. Essa arma se chama conhecimento. Se você até hoje nunca viu o Direito como uma forma de ajudar aos outros, SEM ESPERAR NADA EM RETORNO, colega...você precisa de uma boa dose de ideologia pra viver.

Se fui grosseiro, perdoem-me, não gosto de ver o descaso ao qual certos abomináveis tratam um curso tão promissor. Por favor, estudantes, não esqueçam de vós, não esqueçam de vossa ideologia. Não permitam que o dinheiro compre sua alma. É o único presente de real valor que lhe foi dado.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Desconcerto

Sabe aqueles dias que parecem intermináveis? Você se vê face a face com coisas que você detesta em sua vida? Essa terça-feira foi um desses dias para mim. Eu convivo diariamente com uma sensação de que falta algo. E encarar assim de uma vez vários desses desconcertos da vida é realmente frustrante. É como te jogar numa casa de espelhos, e pra qualquer lugar que você olha vê os seus defeitos; aumentados, diminutos, tamanho real, mas seja como for, defeitos. E agora, José? Terminar o dia se sentindo um caco é meio que um efeito certo de dias assim. E eu me sinto tão cansado de tanta coisa dando errado, que na maior parte do tempo eu aprendi a ser indiferente ao que me acontece, uma semi-frieza defensiva. Mas é natural. O que me irrita mesmo é uma esperança que invade meu coração rápida e furtivamente sempre que algo parece que vai dar certo. E as folhas dessa árvore de esperança são sempre tingidas de medo que tudo dê errado de novo. E eu tento matar a esperança, galho por galho. Afinal, se ela cair, que já seja uma pequena moitinha ao invés de um carvalho gigantesco; o estrago ocorre, mas é bem menor. É normal isso? Alguém no mundo também sente isso? Um fato curioso foi um sonho que tive na noite anterior à que escrevo esse texto. Sonhei que eu morria. E no começo aceitei austero a perda da vivência terrena. Mas meu coração se encheu de desespero ao lembrar de tudo o que eu deixaria pra trás, com todos os desconcertos possíveis. Sabem, eu realmente me sinto alguém insatisfeito com minha própria vida, mas vida defeituosa é melhor que vida nenhuma não?
E um dia, eu hei de perceber que não são os tapas que a vida dá que vão ficando mais fracos. É o rosto que vai ficando mais duro. E na dureza do rosto, perdeu-se o sorriso. Então, vou assim, aos poucos, amolecendo meu rosto, porque mesmo sentindo dor mais forte, serei sempre capaz de sorrir.

Aos melhores amigos

-É verdade que o que aqui escrevo deveria ser direcionado, mas me perdoe, meu melhor amigo, se por esse texto faço uma declaração a todos os melhores amigos que existem no mundo-

"O deserto era a apoteose de todos os desertos, imenso, estendendo-se para o céu no que parecia ser eternidade em todas as direções" - Stephen King, 'O pistoleiro'

Certa vez me dissestes, meu amigo, que tua vida era como um campo de batalha; repliquei que a minha não, era como um deserto. E continuei sobre isso dizendo: "Quando estás em um deserto e olhas para a frente, o que vês?". "Nada", me respondestes. "E quando olhas para trás, o que há?"; "Nada". "E para os lados?". Desta vez não me respondestes. Eu agradeço que não tenhas respondido. Meu amigo, eu tenho medo desse deserto que é minha vida, mas ao meu lado, agora percebo, que ainda te tenho. Me acompanhas a passos estreitos há um tempo, e muito obrigado por isso. Quantas vezes eu te disse que nada dura, que todas as construções da vida são feitas em alicerces frágeis e sempre terminam por desmoronar. Obrigado meu amigo, por ficar comigo quando algumas estruturas de minha vida desabaram. Obrigado pelas incontáveis alegrias, obrigado por um pouco de sombra e água no meu deserto. Mas bem sabes, amigo, como sou tão medroso devido a todas as tempestades de areia em que já me vi, perdido, sozinho e confuso, e tenho que dizer ainda que temo que tua presença seja ilusória como uma miragem. Os desertos são cheios disso. E temo ainda mais, que se fores um Oásis eu tenha um dia  de partir e continuar a jornada e deixar tuas águas puras e tua sombra agradável para trás e navegar novamente sem rumo e sozinho pelas areias escaldantes. Mesmo assim, eu agradeceria a Deus todos os dias por ter te conhecido. Meu amigo, não sei o que será de minha vida em tempos futuros, nem tu sabes da tua, mas obrigado por ter sido parte dela. Espero que eu tenha sido tão importante para ti como és a mim. E, para terminar esse pequeno desabafo, mesmo que eu tenha que continuar viagem, nunca te perderei de vista. Guarda-te bem, meu melhor amigo.



A truthful fairytale

Internet e os Zumbis

Quando o telefone foi criado, aposto que Graham Bell não tinha pensado em sequestros e ligações com pedidos de resgates, nem nos amantes usando o telefone como um túnel para encontros às escuras. Assim como quem teve a idéia de criar a internet não imaginou a insônia de proporções mundiais que ela causaria. Eis um relato de uma vítima da internet, que descobriu os prazeres e os problemas que essa Senhora de presença mundial oferece. Bom, morrendo de sono e mesmo assim não consigo parar de encontrar coisas interessantes para se ver na internet. Qual é, isso é mesmo normal? Isso tem que ter uma pitada de magia! Enfim, não vi aqui criticar a algoz de meu sono, vim apenas falar sobre o que temos em comum. E nem venha me dizer que você nunca teve insônia por conta dela que mentir é feio, principalmente na presença dela que sabe tudo o que você faz. Esse é um daqueles posts que você termina de ler e pergunta "Por que diabos ele tá falando disso?", é simples meu caro leitor, assiduidade em postagem causa uma falta de assunto terrível, e leitores renomados costumam falar de seus vícios quando não há outra coisa sobre a qual falar. Meu único vício que poderia causa-nos uma conexão é a internet. Enfim, reflita sobre o quanto você deixa a internet dominar seu sono, e partir disso seu cérebro irá involuntariamente notar os outros vícios ocultos e trabalhará para saná-los. Boa tarde, leitores.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

O maior monstro já criado

Salvador Dalí, um dos maiores expoentes do surrealismo deixou uma herança sem igual para a humanidade. Ele teve uma visão do maior monstro já criado e colocou seu retrato, misturado com a mais pura essência de eufemismo, em uma tela que se espalhou rapidademente. Que coisas tenebrosas devem ter passado pela cabeça de Dalí ao ver a face crua de tamanha besta? Não ouso imaginar. E em seu medo e espanto colocou um nome vulgar para a obra: A persistência do tempo.Igualmente de tamanho espanto partilhou "O Bruxo" de Drummond, Machado de Assis, que de súbita visão também viu de relance o reflexo da criatura; segundo o que se conhece, Assis teria dito "O mais feroz dos animais domésticos é o relógio de parede. Conheço um que já devorou três gerações da minha família". E nesta noite tão simplória encontrei-me eu com este ser tão assustador. Meu reflexo no espelho foi meu guia pelas entranhas do monstro, e pouco a pouco fui vendo aquilo que O Tempo devorou. Levou-me alegrias, amores, esperanças e sonhos. Que horror, meu Deus! E cada uma das minhas fotografias, minhas lágrimas de tristeza e alegria, meus brinquedos de infância, meu berço. Lá estava tudo, intacto. E a cada visão era como se eu engolisse uma navalha que revirava meu interior por completo. E eu chorei. Ah, chorei, por medo, por arrependimento, por saudade. E não seria outra a maior arma do Tempo que não a saudade. Te fere como aço em brasa. E quanto, meu Deus, quanto eu não pude ver que o monstro já levava embora até mesmo de minha mente? Os beijos de amor que partilhei com quem amei (amei sim, pois amor não precisa ser uma fábula eterna para ser amor), as alegrias e experiência inebriantes que tive. Que espada hão de inventar para que eu possa cravar no estômago da besta e tomar tudo meu de volta? Tudo! E eu me deparei com meu reflexo, meu amigo desde que me lembro, dizendo "Meu anjo, meu amigo, não te deixes pertubar. Nada disso volta, é verdade, mas não há como ter um futuro se te apegas ao passado! Deixa que a besta leva, pois a vida te traz cada vez mais."; e minha garganta respondia que não, meus olhos respondiam que não, e minhas lágrimas caiam. Que visão aterradora tive desse monstro. E agora o futuro é uma névoa escura e meu passado é uma saudade sem fim. Como encarar a vida sem medo, se não posso ver um palmo à minha frente? Tenho medo, minha alma bem sabe, mas o meu morador do espelho nunca mentiu pra mim, nem quando doente, ou gordo, ou cansado, nunca me contou uma leviandade. E outras visitas às entranhas do monstro farei, certeza essa eu tenho, mas que o meu presente seja tão dourado que não me aflinja o brilho do que reluz dentro do Tempo. Meu passado me assombra, meu futuro me assusta, mas meu presente é a chance de espantar todos esses temores de mim. Que um dia se invente um antídoto para o veneno do tempo.


Danilo C. Lopes